Democratização do metaverso: como cada geração pode ser atendida pela experiência
Se o consumidor agora é phygital, o metaverso é o lugar onde o real e o virtual se encontram, temperando o físico e trazendo o digital para mais perto do cliente. Mas, o metaverso é para todos? Como cada geração pode ser atendida por essa nova experiência?
Para o neurocientista e futurista Álvaro Machado Dias, professor livre-docente da UNIFESP e sócio do Instituto Locomotiva, depende do tipo de metaverso que estamos falando.
Segundo o professor, a democracia de um ecossistema digital é determinada por uma combinação de disponibilidade de instrumentos e receptividade dos seus participantes a perfis variados de pessoas.
Então, partindo da ideia de que o metaverso é o conceito atualmente utilizado para se referir ao ecossistema que vem se formando na medida em que as distinções entre o que é material e o que é uma projeção se diluem, a democratização do metaverso seguirá dois caminhos: quando usado em casos de realidade aumentada, o metaverso deverá se tornar uma espécie de relacionamento primário com o mundo, sendo mais democrático, do ponto de vista sócio-relacional.
Já a versão usada na realidade virtual, deverá seguir nichada e mais acolhedora para jovens do que para os mais velhos.
“Porém, para ser de fato democrático, mencionei acima que o ecossistema precisa de disponibilidade instrumental e, sendo assim, o metaverso será tão democrático quanto a sociedade em que se insere: onde a pobreza é ampla e os custos de aquisição tecnológica são altos, as zonas de exclusão imersivas serão largas. E vice e versa”, complementa o neurocientista.
Tipos de metaverso
Para Álvaro Machado Dias, na prática, o metaverso será de dois tipos: o metaverso virtual e o aumentado.
Metaverso virtual é o que acessamos usando VR (realidade virtual), que blinda sensorialmente o participante do mundo exterior. Ele é fundamentalmente social e tem o endosso dos gamers e das plataformas sociais, como Roblox e Facebook Horizons.
Já o metaverso aumentado é o que será acessado por AR (realidade aumentada), que se sobrepõe ao mundo exterior, permitindo, por exemplo, mobilidade urbana.
“De acordo com a visão que venho defendendo, o metaverso aumentado irá surgir da convergência das seguintes tendências tecnológicas: internetização de tudo, gêmeos digitais, 5G, realidade estendida, tokenização e, acima de tudo, inteligência artificial”, acredita o professor.
O metaverso para os Millennials, Baby Boomers e gerações mais velhas
Segundo o professor, hoje em dia, a verdade é que as gerações mais velhas ainda não enxergam a realidade do metaverso com muita clareza. E isso ocorre por uma razão simples: o metaverso mais consolidado é o virtual, e este é muito ligado ao universo gamer nos moldes da geração Z.
“No futuro, as coisas irão se inverter, dado que o metaverso aumentado terá escopo dimensionado pelo consumo, que é maior entre os mais velhos. Assim, por exemplo, millennials e boomers não irão necessariamente estar presentes nos shows de hip hop do Roblox, mas irão movimentar a parte mais relevante do comércio phygital, usando óculos de realidade aumentada no lugar de celulares”, prevê.
Contudo, o neurocientista complementa que o metaverso não precisa atender as necessidades de todas as gerações, em todos os sentidos, mas, que será preciso fazê-lo de maneira imersiva em ao menos duas necessidades básicas do ser humano: o acesso a bens e informações e a moedas e pagamentos digitais.
“Na medida em que uma das grandes tendências do metaverso é a substituição dos smartphones por óculos de AR, em um contexto de relação com o capitalismo da informação intrinsecamente digital (tanto no que se refere ao acesso a produtos, quanto ao acesso às ideias), a exclusão da lógica aquisitiva e relacional típica deste ecossistema trará impactos profundos.
E a digitalização do dinheiro (tanto por meio de moedas digitais do Banco Central, quanto em função de tokens privados), quem não estiver conectado ao metaverso tenderá a estar também desconectado do sistema financeiro”, esclarece.
A euforia do metaverso se justifica?
Para Álvaro Machado Dias, é impressionante a grande a aderência do público aos conceitos do metaverso, a despeito do mesmo ainda contar com implementações capengas.
Por exemplo, as buscas pelo termo “NFT” ultrapassaram “blockchain” no Google, em 2022. Porém, o NFT é um subproduto do blockchain, que não tem um décimo do seu tempo de existência e só cresceu por causa do metaverso.
Walmart e Amazon vêm puxando a entrada do varejo digital com força total e grande parte dos terrenos comprados na Decentraland (plataforma de mundo virtual 3D, onde usuários podem comprar terrenos virtuais) e outros ambientes imersivos é para colocar lojas, em função da boa receptividade do consumidor mostrada pelas pesquisas globais de varejo.
Quer dizer, preservado o fato de que se trata de metaverso virtual, que é limitado pelo uso de VR, um equipamento de apelo geracional, o entusiasmo está aí e é surpreendente. Este, por sua vez, é um prenúncio da fidelização.
A questão hoje em dia é: até que ponto a coisa toda está inflada demais, os terrenos em metaversos artificialmente caros e as vendas de NFT irracionais? Se este for o caso, o melhor a fazer é esperar baixar um pouco para entrar”, acredita o futurista.
Indo muito além do universo gamer
De acordo com o professor, o setor que mais irá se beneficiar do metaverso é o marketing (ou, mais especificamente, o casamento de publicidade e marketing), que deverá ganhar novo ânimo com o metaverso.
“O apogeu do marketing digital marcou o declínio da publicidade, da criatividade e do acabamento, em prol do BI, das métricas e customização de ofertas. Esse é um terreno desfavorável para a disciplina, na medida em que seus resultados deixam de importar pelo que têm de único, passando a importar apenas pelo volume.
Na base de tudo está o fato de que o ambiente bidimensional da tela do computador torna o consumo de propaganda uma tremenda chatice. E o metaverso inverte isso.
A relação com avatares, objetos tridimensionais, lojas transadas em prédios que desafiam as leis da física e muito mais, resgatam e amplificam o potencial criativo que tende a levar as pessoas a esta profissão, fazendo-a renascer numa base muito mais interessante do que a dos tempos áureos da televisão.
A renovação da publicidade e do marketing deve levar o varejo a um novo patamar de expressão e as marcas às formas de relacionamento com a sociedade phygital muito mais profundas do que as que conhecemos”, conclui o neurocientista.